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Meus cachorros
os cachorros
não me deixam dormir
não se calam
e não me deixam calar
talvez cão eu esteja
latindo em insônia
sem explicação
pensando no acaso
do próximo depois
já antecipado
calem-se!
seus vira-latas
bando de panacas
que deixam de prontidão
a noite
apenas deixem
meu dia
descansar
sem nenhum
açoite
Eiva
meus dedos
deslizam
afetos
em teclas frias
emerge calor
escrito em desverso
revelo
a obra de arte
imperfeita
criada
para durar
quando quiser
O lugar do futuro
é sobre o amanhã que não sei
é sobre o meu olhar na janela
de quem sabe eu ver a vida
com o tempo de rugas
evocar a alvorada
do parto da minha meninice
na ampulheta do meu vilarejo
prezo em vislumbrar
o agora
que esperanço
ser depois
Empedrou-se
pedra gélida
divagava nas tantas madrugadas
em ruas de sono
em silêncios de noite
observava as casas trancadas
batentes de gatos
sombras de amores banais
becos à procura de transeuntes
e depois choveu
veio um abraço de sol
e empedrou-se no amanhecer
de nunca mais
Corpo(s)
Árvores de poucas folhas
Cinzentas
Respiram a manhã que tem
Fazem amor dançando
Arrepiam os caules nus
A cada sarrada do vento
Pedras comem raízes
E o gozo é natural
Confundi com o mar
galhos secos cantavam
envoltos ao vento
mar de folhas chão
encharcado de ondas férteis
roçavam em pedras
nasciam xique-xiques
rasgando o fundo do mar
senti o mar do sertão
molhar-me com mormaço
O outro lado de dentro
tenho a gramática das coisas
pedra é órgão da terra
homens são feitos de versos
céu é poema azul
e lua é furo de luz
tenho a gramática das coisas
palavras são bocas de som
silêncio compõe canções
calendário são números de ontem
e o tempo nunca viu ninguém
Bilhete fúnebre
imprestável guerra
são balas humanas frias
túmulos de terra
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