0 Comentários
Antefaces
escondeu-se pelo cuidado
seu rosto guardado metade
cheiro descartável invade
a respiração de um sorriso largo
enclausurado pela farsa
começou a chamar de riso
os olhos que viam o outro
Perceptível a olho nu
ao seu redor tudo era vivo
as formigas besouros escorpiões
aranhas lacraias minhocas
todos rastejadores de cotidiano
habitantes de instantes
cada um no seu percurso
tanta vida na miudeza
envergonhou-se em ser pedra
quebrou-se ao meio
e viu a beleza de dentro
seu ser-tão vivo
Intransponível
a estrada me olhou
com os olhos devoradores de passagem
pegadas de ontem enfileiradas
seguiam seu curso sem volta
passagem é nome-cidade
de habitantes nômades
somente as marcas
permanecem
riscadas em caules
em baixo relevo chão
fezes
tudo fica pra ontem
Miragem sertão
depois da janela
o sol beijava as coisas
filhote de pássaro chamava a mãe
a macambira arranhava pedras
depois da janela
recriei a cena
sertão tinha pernas
de sariema
andava na terra quente
comendo poeira de redemoinho
sertão tinha olhos
de espinhos facheiro
avoava da cor de concriz
no rastro da cascavel
cantava repente
e cuspia o veneno do peito
depois da janela
sertão rezava
de unha encardida
com terço na mão
ave maria na boca da noite
depois da janela
silêncio estiagem
badalava o chocalho pouco
sertão chorava água doce
no sonho de um inverno pesado
Manifesto
ao mundo de gente
eu grito:
ódio não é coisa boa
é desgraça guardada
em garrafa de vidro
ao mundo de gente
eu digo:
rancor não é coisa boa
é cativeiro algoz
no corpo escondido
ao mundo de gente
eu choro:
depressão não é coisa boa
é sangue alvacento
inodoro
ao mundo de gente
eu sussurro:
escuta coisas boas
há chance para vida
escalar os muros
ao mundo de gente
eu trago oração:
sorria de dentro
escancare os dentes
da face do seu coração
Burocracia
oh dia burocrático!
venho por meio deste ofício
pedir-lhe com muito esmero
que faça um sacrifício
muito simples por sinal
estique a boca da segunda
para que as terças, quartas, quintas
e sextas-feiras desprendam o riso
e façam a semana toda
burocraRISAR
Suicídio poético
hoje me deu vontade
de rasgar todos os poemas
que talvez nem sejam poemas
que penei em escrevê-los
hoje pensei em assassinar o poeta
que talvez nem seja poeta
mas penei em querer ser
nem que fosse em um instante
hoje ocasionou desânimo
um fracasso descomunal
pessimismo estranho
quebrei o ego do meu lápis tolo
hoje não me deu vontade de poeta
não me deu vontade de rima
não me deu vontade
vontade nenhuma
hoje me entrego
ao suicídio das palavras
morto nos versos
quem sabe assim
viro poesia
///
Tags:#berrandopoesia, #literaturabrasileira, #poesia, #poesiabrasileira
Parabéns wagner!!poeta excelente!!