0 Comentários
Na madrugada do dia 12 de novembro, a Grande Messejana, em Fortaleza, amanheceu banhada de sangue pela maior Chacina da história do Ceará. Contabilizamos um número bem maior de vítimas do que os 11 moradores mortos noticiados pelos jornais, algumas das quais ainda não tiveram seus nomes divulgados (e não o faremos aqui por questão de segurança): Antônio Alisson Inácio Cardoso, 17 anos (morto no bairro de Curió, às 0h20min); Jardel Lima dos Santos 17 anos (morto no bairro de Curió, às 0h20min), Desconhecido do sexo masculino, 18 anos (morto no bairro de Curió, às 0h20min); Marcelo da Silva Mendes, 17 anos (morto no bairro de Alagadiço Novo, às 1h54min); Patricio João Pinho Leite, 16 anos (morto no bairro de Alagadiço Novo, às 1h54min); Jandson Alexandre de Sousa, 19 anos (morto no bairro de São Miguel, às 3h33min), Francisco Elenildo Pereira Chagas, 41 anos (morto no bairro de São Miguel, às 3h33min); Valmir Ferreira da Conceição, idade desconhecida (morto no bairro de São Miguel, às 3h33min); Pedro Alcantara Barroso do Nascimento, 18 anos (morto no bairro de Messejana, às 3h57min); Marcelo da Silva Pereira, idade desconhecida (morto no bairro de Messejana, às 3h57min); Desconhecido do sexo masculino, dade desconhecida (morto no bairro de Messejana, às 3h57min).
As organizações de defesa de direitos humanos e movimentos sociais que subscrevem esta Nota solidarizam-se, antes e acima de tudo, com as famílias de todos os assassinados e juntam-se às vozes dos moradores e moradoras no repúdio a esta ação bárbara e à denúncia de que possíveis agentes de segurança executaram, aleatoriamente, pessoas que encontraram na madrugada do dia 12 de novembro com o perfil “suspeito”: homens jovens, negros e pobres.
Os/as moradores/as das periferias, sobretudo mães e familiares, há muito denunciam a truculência policial e as humilhações cotidianas que, com frequência, terminam em execuções; assistem e sofrem, ainda, a culpabilização da própria violência que sofrem na fórmula automática e imediatamente repetida de sua associação com o comércio ilegal de drogas. Repudiamos a criminalização da pobreza e a utilização do tráfico como justificativa para as execuções sumarias; tampouco permitiremos a naturalização desse massacre com a justificativa de algumas das vítimas terem “passagem pela polícia” – no caso, por ameaça, acidente de trânsito e pensão alimentícia.
Na Chacina da Grande Messejana, a lógica do militarismo de que há um inimigo interno sem direito à vida esteve evidente. O debate sobre Segurança Pública foi historicamente monopolizado por setores reacionários que, de forma oportunista, propõem medidas fragmentadas e de pouco impacto sobre os reais motores da conflitualidade social, mas com forte apelo eleitoral. São medidas de recrudescimento criminal para dar conta das desigualdades sociais, que, de um lado, legitimam a morte em massa e, por outro, almejam o crescimento do Estado de Exceção: ocupação militar de favelas, redução da maioridade penal, restrições às liberdades, praticas higienistas e de “limpeza social”, aumento da segregação espacial, leis que criminalizam lutadores/as sociais, revisão do estatuto do desarmamento e outras tantas formulas de recrudescimento do Estado penal e policial.
Posicionamo-nos, convictamente, contra essa lógica de guerra e massacre. O debate que temos travado enquanto organizações de direitos humanos e movimentos sociais não se restringe ao modus operandi das forças militares, mas abrange sobretudo a denúncia e o enfrentamento da materialização de um direito – e de todo o aparato que o acompanha – desigual, no qual uns são tidos como descartáveis ou, para colocar de forma mais explicita, “matáveis”, e outros como cidadãos de bem. Contra essa lógica afirmamos que segurança pública não é guerra e que o povo não é inimigo. Não queremos tanques de guerra nos nossos bairros; queremos o que é direito de todos e todas: dignidade.
Se a barbárie é uma realidade na capital com maior índice de assassinatos de adolescentes; se o Brasil é o segundo país do mundo em homicídios de jovens; se a polícia militar brasileira é a mais letal do mundo; nossa resposta se dará pela organização e resistência popular que não se dobra às ameaças ou ao fascismo das ‘autoridades’.
DEFENDEMOS ABSOLUTA PRIORIDADE PARA A INVESTIGAÇÃO DOS RESPONSÁVEIS PELA CHACINA; PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA IMEDIATA À FAMILIARES E TESTEMUNHAS; O FORTALECIMENTO DE MECANISMOS EXTERNOS DE CONTROLE DA ATIVIDADE POLICIAL.
Posicionamo-nos, por fim, pela desmilitarização da polícia e da política, por uma política alternativa à criminalização das drogas e contra o extermínio da juventude nas periferias e pela defesa intransigente, garantia e afirmação dos Direitos Humanos. Defendemos, ainda, a indenização e a reparação simbólica, com a alteração das designações das ruas com os nomes das vítimas da maior chacina da história de Fortaleza.
CHEGA DE MASSACRE!
Assinam essa nota, até o momento:
- Comitê Cearense pela Desmilitarização da Polícia e da Politica
- Revista Berro
- Fórum DCA
- Coletivo SocioAmbiental
- RUA – Juventude Anticapitalista
- RENAP – Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares
- REAJAN – Rede de Articulação do Jangurussu e Acari
- CEDECA-CE – Centro de Defesa da Criança e do Adolescente
- Pastoral do Menor
- DIACONIA
- Aparecidos Políticos
- Fórum de Juventudes do Rio de Janeiro
- ARPIA – Articulação de Psicólogas/os e Psicanalistas Iara Iavelberg
- Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza
- Rede DLIS
- Fórum Cearense de Mulheres
- INEGRA – Instituto Negra do Ceará
- Tal Coletivo de Comunicação
- Diretória Acadêmico Tristão de Athayde
- Executiva Nacional das de dos Estudantes de Comunicação Social
- Instituto Ambiental Viramundo
- Jovens Agentes da Paz (JAP)
- Centro de Cidadania e Valorização Humana
- URUCUM – Direitos Humanos, comunicação e Justiça
- Plataforma de Direitos Humanos – Dhesca Brasil
- Coletivo Retirantes
- Fundação Marcos de Bruin
- Pastoral Carcerária do Ceará
- Projeto Comunitário Sorriso da Criança
- Escritório de Direitos Humanos da Unichristus
- Centro de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos da Arquidiocese de Fortaleza
- Fórum de Cultura do Grande Bom Jardim
- Instituto Terramar
- Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ)
- Sindicato dos Jornalistas do Ceará (Sindjorce)
(Passa assinar a nota, enviar email para: desmilitarizar@riseup.net)