Estriado e cardíaco



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(Arte: Banksy)

Por Marla Monise

O coração é um músculo estriado cardíaco cujo movimento é involuntário, controlado pelo bulbo cerebral (que faz questão de ser sistema nervoso autônomo e de dar conta dos nossos mais primitivos instintos). Um músculo cardíaco humano adulto tem em média de sessenta a oitenta batimentos por minuto.

Desfibrilador é um aparelho criado pela ciência moderna que libera descarga elétrica. Seu advento trouxe para a medicina a possibilidade de paralisar toda a atividade do músculo cardíaco, cessando todas as arritmias, na tentativa de que o recomeço das contrações e relaxamentos voltem ao compasso normal.

Nas relações criadas pelos seres humanos, verifica-se uma ligação cerebral que cria uma série de interferências nervosas e cardíacas entre si, para que estas expressem em nosso corpo as nuances dos pensamentos e sentimentos criados no cérebro.

(…)

São pequenas mortes que me ocorrem no corpo quando nas relações humanas o amor, no sentido mais amplo e versátil da palavra, é tomado de tantos outros sentimentos que confundem, que maculam e que tornam isso em algo doloroso, nem sempre fácil porque permeados de mal entendidos que…

– AFASTA!

São pequenas mortes que me ocorrem no corpo quando as decepções acontecidas dão causa a arritmias, posto que aquelas só vieram a acontecer quando se pressente a inveja, a raiva, a mágoa causando em cada um de nós as piores sensações no sentido de…

– AFASTA!

São pequenas mortes que me ocorrem no corpo quando não tenho mais condições de lidar com os medos oriundos das mais diversas e bobas situações cotidianas que colocam em xeque até o que houve de mais puro, construído esmerosa e lentamente e que, como fora uma gota de mercúrio na água, contamina e seca o gérmen de todas as virtudes porque causam incômodo, geram inconsistências, insônia me levando a…

– AFASTA!

São pequenas mortes que me ocorrem no corpo quando as inconstâncias vão ficando recorrentes e sinto uma necessidade incontrolável de usar o último recurso que me resta, querendo paralisar todas essas frequências mal ajustadas e complexas…

– AFASTA!

É quando se nota que existe um choque letal sendo brutalmente jogado dentro do nosso corpo na tentativa insana de combater o infarto lírico e épico que está ocorrendo pelas frustrações e inquietações criadas no cérebro.

O problema maior é quando lembro que o meu músculo estriado cardíaco não funciona em sua plenitude porque tem uma válvula que sopra. Ela não consegue deixar todo o sangue velho ir embora e receber o novo inteiramente limpo. É uma condição não cerebral, um defeito de fábrica corporal que me impede e interfere que eu consiga simplesmente deixar jorrar sangue novo, arterial, sem que ele seja contaminado por sangue venenoso venoso, premiando-me com o que fizeram questão de chamar de “insuficiência cardíaca”.

É como se eu quisera nascer de novo dessas pequenas mortes que me atacam, me abalam, mas sempre vai existir a válvula soprando no peito, chiando na ausculta, pra lembrar que ainda que eu nasça de novo, o coração é velho, cheio de problemas e vai continuar carregando farpas e mágoas antigas de um músculo (ah, que irônico) que é involuntário porque pulsa independente da sua vontade, a despeito das suas mortes mentais, decepções trágicas, sensações que não deveriam integrar sua mente, mas interferem, causam arritmias. Não, meu coração não está preparado para essas contingências de forma leve, compassada e normal.

Meu coração sopra, eu sofro, ele descompassa e eu morro:

– AFASTA!


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