![\"\"](\"http:\/\/revistaberro.com\/wp-content\/uploads\/2014\/10\/democratizac3a7c3a3o_comunicac3a7c3a3o_rafael_stedile.jpg\")
Os meios de comunica\u00e7\u00e3o s\u00e3o atualmente uma ferramenta imprescind\u00edvel na disputa por posi\u00e7\u00f5es no campo da hegemonia ideol\u00f3gica e, consequentemente, para a manuten\u00e7\u00e3o da ordem simb\u00f3lica, s\u00f3cio-econ\u00f4mica e pol\u00edtica vigente. No Brasil, a comunica\u00e7\u00e3o est\u00e1 nas m\u00e3os de um oligop\u00f3lio formado por grupos empresariais de poucas famiglias<\/em>, que det\u00eam o controle majorit\u00e1rio da produ\u00e7\u00e3o, da distribui\u00e7\u00e3o e da veicula\u00e7\u00e3o do conte\u00fado midi\u00e1tico nacional. Para completar o quadro de terror, essa m\u00eddia ainda dita, \u00e0 sua maneira mercadol\u00f3gica, padr\u00f5es culturais e de comportamento atrelados \u00e0 l\u00f3gica da supervaloriza\u00e7\u00e3o do dinheiro e do consumo.<\/p>\n Para o coordenador executivo da Associa\u00e7\u00e3o Mundial das R\u00e1dios Comunit\u00e1rias (AMARC- Brasil), Jo\u00e3o Paulo Malerba, \u201csem um cen\u00e1rio midi\u00e1tico plural e diverso \u00e9 imposs\u00edvel garantir os pressupostos b\u00e1sicos da democracia\u201d. Malerba, que tamb\u00e9m \u00e9 jornalista e doutorando em Comunica\u00e7\u00e3o e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), defende que \u201ca luta pela democracia envolve a luta por um maior equil\u00edbrio de vozes na sociedade\u201d.<\/p>\n De acordo com Raquel Dantas, jornalista e integrante do Intervozes<\/em>, organiza\u00e7\u00e3o formada por ativistas e profissionais de Comunica\u00e7\u00e3o Social e outras \u00e1reas, com membros espalhados em 15 estados brasileiros e no Distrito Federal, “esse sistema (de comunica\u00e7\u00e3o no Brasil) foi formado com grande interfer\u00eancia de poderosos grupos econ\u00f4micos amparados pelo regime militar na d\u00e9cada de 60. Temos hoje o sistema de radiodifus\u00e3o controlado por pouco mais de 10 grupos, entre fam\u00edlias e igrejas”.<\/p>\n Obviamente, a m\u00eddia empresarial empreende sua tarefa de manter essa concentra\u00e7\u00e3o de modo obscuro e eficaz: vende diariamente mentiras em seus notici\u00e1rios contra movimentos sociais, organiza\u00e7\u00f5es de trabalhadores e iniciativas populares ao tempo em que hipnotiza e entorpece o grosso da popula\u00e7\u00e3o com programa\u00e7\u00e3o que atende aos anseios e modos de comportamento da sociedade do espet\u00e1culo. \u201cA imbecilidade acha que tudo est\u00e1 claro quando a televis\u00e3o mostra uma imagem bonita, comentada com uma mentira atrevida. A aliena\u00e7\u00e3o do espectador em favor do objeto contemplado se expressa assim: quanto mais ele contempla, menos vive\u201d, disse Guy Debord, em A sociedade do espet\u00e1culo<\/em>.<\/p>\n \u00c0 menor tentativa de democratizar os meios de comunica\u00e7\u00e3o no Brasil, o oligop\u00f3lio midi\u00e1tico brasileiro reage enfurecido e acusa os militantes da democratiza\u00e7\u00e3o de serem contra a liberdade de imprensa. O que essa mesma imprensa n\u00e3o fala e faz quest\u00e3o de esconder \u00e9 que, em diversos pa\u00edses ao redor do mundo como Reino Unido, Alemanha, Fran\u00e7a, Espanha, Argentina, Uruguai, Equador, Bol\u00edvia, entre outros, h\u00e1 \u00f3rg\u00e3os reguladores de comunica\u00e7\u00e3o, que atuam, principalmente, no combate \u00e0 concentra\u00e7\u00e3o e na regula\u00e7\u00e3o do conte\u00fado.<\/p>\n Autor de diversos livros, entre os quais Comunica\u00e7\u00e3o Sindical – Falando para milh\u00f5es<\/em> e fundador do N\u00facleo Piratininga de Comunica\u00e7\u00e3o (NPC), entidade com sede no Rio de Janeiro que promove cursos com foco na democratiza\u00e7\u00e3o da comunica\u00e7\u00e3o, Vito Giannotti analisa que a m\u00eddia empresarial age dessa forma \u201cporque o seu intento \u00e9 criminalizar, condenar, pedir o exterm\u00ednio de todo movimento contestador\u201d.<\/p>\n Vale ressaltar que h\u00e1 uma lista disponibilizada com os dons de r\u00e1dio e televis\u00e3o ofereceu uma lista completa dos donos de r\u00e1dio e TV no Brasil<\/span><\/a>. Nela, 56 deputados e senadores aparecem como s\u00f3cios ou t\u00eam parentes no comando de emissoras de r\u00e1dio e televis\u00e3o. De acordo com o coordenador da AMARC-Brasil, \u201cisso contamina toda a discuss\u00e3o sobre a democratiza\u00e7\u00e3o dos meios de comunica\u00e7\u00e3o, pois os parlamentares t\u00eam todo o interesse que as discuss\u00f5es n\u00e3o avancem e as leis continuem frouxas e desatualizadas, favorecendo o chamado \u2018coronelismo eletr\u00f4nico\u2019, poderes locais e regionais garantidos pelo monop\u00f3lio local de meios de comunica\u00e7\u00e3o\u201d.<\/p>\n Toda rela\u00e7\u00e3o de comunica\u00e7\u00e3o \u00e9 tamb\u00e9m uma rela\u00e7\u00e3o de poder, disse Bourdieu, te\u00f3rico franc\u00eas. Dessa maneira, \u201c\u00e9 enquanto instrumentos estruturantes e estruturados de comunica\u00e7\u00e3o e conhecimento que os sistemas simb\u00f3licos cumprem a fun\u00e7\u00e3o pol\u00edtica de instrumentos de imposi\u00e7\u00e3o e de legitima\u00e7\u00e3o da domina\u00e7\u00e3o de uns sobre outros, a viol\u00eancia simb\u00f3lica legitimada\u201d (Pierre Bourdieu, O poder simb\u00f3lico<\/em>). \u00c9 o que Weber chamava de \u201cdomestica\u00e7\u00e3o dos dominados\u201d.<\/p>\n Ent\u00e3o, o que fazer? \u201cComunica\u00e7\u00e3o \u00e9 um direito humano. E isso pouca gente compreende como tal. Sa\u00fade, educa\u00e7\u00e3o, moradia s\u00e3o quest\u00f5es recorrentes quando se pensa em direitos. Comunica\u00e7\u00e3o quase nunca entra na lista. Por isso o debate sobre o tema \u00e9 t\u00e3o complicado”, ressalta Raquel.<\/p>\n A Argentina, com a Ley de Medios<\/em>, aprovada ainda em 2009, e vigorando integralmente desde o ano passado, mostrou que \u00e9 poss\u00edvel caminhar no sentido de democratizar a comunica\u00e7\u00e3o, de desbaratar oligop\u00f3lios, de dar voz a diversos setores sociais historicamente marginalizados do processo comunicacional. Um dos principais objetivos da nova legisla\u00e7\u00e3o argentina \u00e9 criar mecanismos para combater a concentra\u00e7\u00e3o midi\u00e1tica. O processo democr\u00e1tico da constru\u00e7\u00e3o da lei de comunica\u00e7\u00e3o foi referendado, inclusive, pela relatora especial sobre Liberdade de Express\u00e3o da Comiss\u00e3o Interamericana de Direitos Humanos (CIDH\/OEA), Catalina Botero, e pelo relator especial sobre Liberdade de Express\u00e3o e Opini\u00e3o da ONU, Frank La Rue.<\/p>\n No Brasil, ap\u00f3s in\u00e9rcia de mais de dez anos dos governos Lula e Dilma nessa seara, o F\u00f3rum Nacional pela Democratiza\u00e7\u00e3o da Comunica\u00e7\u00e3o (FNDC) est\u00e1 \u00e0 frente da campanha \u201cPara Expressar a Liberdade<\/span><\/a>\u201d, que pretende enviar ao Congresso um projeto de lei de iniciativa popular que verse sobre democratiza\u00e7\u00e3o da comunica\u00e7\u00e3o a partir do recolhimento de um milh\u00e3o e meio de assinaturas, no mesmo molde de como surgiu a Lei de Ficha Limpa \u2013 por iniciativa da sociedade civil.<\/p>\n Vale ressaltar tamb\u00e9m que no fim de abril, ap\u00f3s forte press\u00e3o e mobiliza\u00e7\u00e3o de entidades e ativistas que militam pelo direito \u00e0 comunica\u00e7\u00e3o, a presidenta Dilma Rousseff sancionou o Marco Civil da internet, igualmente chamado de \u201cConstitui\u00e7\u00e3o da web\u201d, com a garantia de neutralidade da rede (ou seja, os provedores que ofertam o servi\u00e7o n\u00e3o podem fazer diferencia\u00e7\u00e3o entre os internautas, no estilo quem paga mais, tem mais velocidade de acesso).<\/p>\n \u00c0 parte a luta dentro dos limites institucionais e legalistas, outra sa\u00edda para a democratiza\u00e7\u00e3o da comunica\u00e7\u00e3o no pa\u00eds \u00e9 fortalecer a imprensa alternativa e comunit\u00e1ria. Para Malerba, \u201cos meios alternativos e comunit\u00e1rios atuam diretamente no sentido de favorecer os dois pressupostos b\u00e1sicos da democratiza\u00e7\u00e3o da m\u00eddia: a amplia\u00e7\u00e3o no acesso e na participa\u00e7\u00e3o\u201d. Ainda de acordo com o coordenador da AMARC-Brasil, \u201cas m\u00eddias comunit\u00e1rias surgem como uma possibilidade de que novos sentidos sejam agenciados nas esferas de negocia\u00e7\u00e3o do poder: indiv\u00edduos historicamente exclu\u00eddos do processo comunicacional t\u00eam a chance de que suas demandas passem a circular na sociedade atrav\u00e9s de suas pr\u00f3prias enuncia\u00e7\u00f5es”. .<\/p>\n Giannotti \u00e9 taxativo: \u201cA imprensa alternativa precisa existir. \u00c9 preciso perder as ilus\u00f5es de ter um espa\u00e7ozinho na \u201cgrande m\u00eddia\u201d e criar sua pr\u00f3pria m\u00eddia. Criar todo um mosaico de instrumentos de comunica\u00e7\u00e3o, do r\u00e1dio \u00e0 tev\u00ea, do jornal ao cinema, das m\u00fasicas \u00e0 revista. Usar tudo: camisetas, broches, bandeiras, faixas e todo o arsenal da internet, da p\u00e1gina ao blog, do boletim eletr\u00f4nico ao Facebook, de um filme no Youtube a um festival de samba, rock, ou funk. Tudo\u201d.<\/p>\n Segundo Raquel, a import\u00e2ncia da imprensa independente e alternativa ao PIG se d\u00e1 tamb\u00e9m porque ela “dificilmente ir\u00e1 repetir discursos, porque essa comunica\u00e7\u00e3o surge justamente da necessidade de algo que n\u00e3o se diz, algo que n\u00e3o se discute, outros olhares que n\u00e3o s\u00e3o oferecidos, bem mais condizentes e pr\u00f3ximos da realidade de quem faz e pra quem comunica”. Ainda de acordo com a integrante do Intervozes<\/em>, \u201cquanto mais iniciativas de comunica\u00e7\u00e3o independente tivermos, mais gente estar\u00e1 atenta ao debate da democratiza\u00e7\u00e3o e mais press\u00e3o faremos para que o sistema mude. A comunica\u00e7\u00e3o pode desencadear grandes revolu\u00e7\u00f5es: culturais, pol\u00edticas, sociais. \u00c9 dar ao povo o que deveria ter sido dele desde o princ\u00edpio\u201d. Oxal\u00e1!<\/p>\n \/\/\/<\/p>\n *Reportagem publicada na Revista Berro \u2013 Ano 01 \u2013 Edi\u00e7\u00e3o 01 \u2013 Maio\/Junho 2014<\/a>\u00a0. (aqui, vers\u00e3o PDF<\/a><\/span>)<\/strong><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" Os meios de comunica\u00e7\u00e3o s\u00e3o atualmente uma ferramenta imprescind\u00edvel na disputa por posi\u00e7\u00f5es no campo da hegemonia ideol\u00f3gica e, consequentemente, para a manuten\u00e7\u00e3o da ordem simb\u00f3lica, s\u00f3cio-econ\u00f4mica e pol\u00edtica vigente. 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