Pedro Ekman: “A democratização da comunicação é fundamental para a consolidação da democracia”



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(Foto: arquivo pessoal) 

O coordenador do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, Pedro Ekman, conversou com a Berro sobre democratização da comunicação, verbas publicitárias federais, liberdade de imprensa, Ley de Medios argentina, Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), entre outros assuntos. Ekman é formado em Arquitetura pela Universidade de São Paulo (USP) e foi produtor de conteúdo de duas temporadas do programa A Liga, da TV Bandeirantes. Atualmente é coordenador do Intervozes, onde roteirizou e dirigiu o curta-metragem Levante sua voz, produzido pela organização. Confira a entrevista abaixo:

Por que é preciso democratizar a comunicação no Brasil? Como está esse processo noutros países do continente?

A democratização da comunicação é fundamental para a consolidação da própria democracia. A concentração existente no mercado de comunicação restringe as ideias em circulação. O problema é que a comunicação historicamente foi tratada em nosso país como uma questão comercial e não como um direito. Para democratizar, precisamos mudar essa concepção atualizando nosso marco regulatório com instrumentos que garantam efetivamente um direito que hoje está vedado à grande maioria.

A Europa já tem longa tradição no combate aos monopólios possuindo legislações com eficiente regulamentação do setor de comunicação. No continente americano, essa história começou a ser escrita mais recentemente, com destaque para o que Equador, Bolívia, Argentina e Uruguai vêm fazendo. Esses países se referenciam nos padrões internacionais para rever suas leis sobre o assunto e criar condições mais justas e democráticas de se efetivar o direito descrito no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Quais os principais entraves que emperram um debate mais amplo sobre a democratização da comunicação no Brasil?

As principais barreiras impostas ao debate de uma comunicação democrática são colocadas justamente pelos grandes grupos empresariais de comunicação. Esses grupos são contrários à criação de um ambiente mais competitivo e plural, pois abrir espaço a novos atores significa perder parte do espaço que possuem hoje.

Desta forma, esses grupos vão confundir o conceito de liberdade de imprensa, definindo em seus noticiários toda proposta de regulamentação de mercado como censura ao conteúdo que produzem. Essa confusão é criada para se impedir que o assunto venha a ser debatido a sério e a fundo, pois ela intimida o governo e qualquer um que toque no assunto com a ameaça de ser considerado como um suposto censor autoritário avesso a críticas.

O Brasil poderia beber da “Ley de Medios” argentina?!

Sim, o próprio Relator Especial da ONU para a Liberdade de Expressão, Frank La Rue, considera a lei argentina uma referência para o continente e para o mundo. Essa lei trabalha a comunicação como direito abrindo espaços para a comunicação comunitária e pública. A lei divide em tamanhos iguais o espaço que esses dois tipos de comunicação vão ocupar junto com a comunicação comercial já existente. Ela cria uma agência independente de fiscalização e uma defensoria do público entre outras medidas democratizantes.

Qual o papel da imprensa alternativa nesse contexto de contra-hegemonia midiática?

A imprensa alternativa cumpre um papel fundamental nesse contexto. Os grandes grupos empresariais vão tentar impedir o debate, pois terão seus interesses comerciais contrariados. Uma imprensa que não tenha o lucro como principal objetivo pode fazer esse debate com a independência necessária.

Qual a explicação para o Governo Federal destinar mais de 70% das verbas publicitárias para a imprensa empresarial?

O fato da comunicação nacional estar estruturada em monopólios confere aos grupos empresariais não apenas muito poder econômico, mas também muito poder político. A distribuição de verbas publicitárias é uma das formas de se relacionar com esse poder.

O correto seria não existir publicidade oficial e apenas campanhas de interesse público veiculadas gratuitamente. Considerando o fato de que existe publicidade oficial e de que muito dinheiro é gasto com isso, o governo deveria equacionar melhor a distribuição, pois se for considerar apenas o alcance que a publicidade terá, vai apenas alimentar a lógica de concentração.

Há uma campanha do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação nessa seara de direito à comunicação. Fale um pouco sobre ela.

A campanha “Para Expressar a Liberdade” reúne diversas organizações da sociedade civil e entre elas o FNDC. A campanha tem como objetivo justamente organizar a sociedade civil para debater e propor um novo marco regulatório para as comunicações brasileiras. Como o governo federal recentemente declarou que não irá fazer qualquer movimento nesse sentido, a campanha decidiu elaborar um projeto de lei de iniciativa popular e ir às ruas coletar um milhão e quinhentas mil assinaturas para finalmente abrir o debate sobre essa questão ao mesmo tempo tão importante, sabotada e negligenciada em nosso país.

*Entrevista publicada na Revista Berro – Ano 01 – Edição 01 – Maio/Junho 2014 . Veja aqui a versão PDF


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