Cuba e Estados Unidos: Do embargo ao amadurecimento político



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Um dos argumentos utilizados pelos Estados Unidos para justificar o embargo imposto por aquele país à ilha caribenha é a defesa dos direitos humanos da população cubana. De fato, quem já visitou a ilha percebe que há carência de vários produtos básicos – especialmente daqueles que são industrializados – isso porque o embargo não só proíbe o comércio entre os dois países, mas também com outros países que são aliados comerciais dos estadunidenses.  Além disso, outras medidas também dificultam a vida da população cubana, como a proibição de viagens e o envio de remessas financeiras ao exterior. Tais questões, que tiveram início não somente devido ao embargo, mas também ao congelamento das relações diplomáticas entre os países.

Todavia, para entender o que ocorre entre os dois países é muito importante um breve retorno à história a fim de melhor compreender os fatores que impulsionaram esses acontecimentos.

Cuba foi colônia espanhola e conquistou sua independência em 1901, todavia nunca foi uma nação soberana. Havia um apêndice à sua constituição chamada Emenda Platt que concedia aos Estados Unidos o direito de intervir em assuntos internos, o direito a estabelecer bases militares na ilha e também a monopolizar o comércio interno e externo cubano. Esse conjunto de fatos foi o estopim do estranhamento entre as duas nações, de um lado estavam os norte-americanos, que não queriam abrir mão de sua influência na região, e do outro estava Cuba, que reivindicava ser, de fato, uma nação independente livre da tutela ianque.

Deu-se início então à Revolução Cubana, dirigida pelo advogado Fidel Castro; a guerrilha contra o governo vigente durou três anos (entre 1956 e 1959), e saiu-se vencedora. Em 1959, Castro tomou o poder e instituiu seu regime anti-imperialista, nacionalizando refinarias de petróleo sob comando de empresas norte-americanas. Por sua vez, o governo dos Estados Unidos cancelou toda sua importação de açúcar proveniente da ilha – o país era o maior importador deste produto -, logo depois proibiu também importações de outros produtos, deu-se início ao embargo entre os dois países que dura até hoje.

A partir daí as duas nações passaram a ter uma relação tensa, os Estados Unidos alegando que Cuba não respeitava os direitos civis e a liberdade de expressão – tema contraditório, levando-se em consideração que os Estados Unidos não são nenhum exemplo de respeito à liberdade de expressão. O recente acontecimento envolvendo o Brasil e a forte manipulação midiática são exemplos incontestáveis disso, tampouco se pode dizer que um país que não garante a sindicalização de seus trabalhadores e o direito à greve possa dar muita lição sobre direitos civis e humanos –, e Cuba resistindo às investidas norte-americanas, denunciando o tratamento desumano e racista contra a população negra e a violência contra qualquer nação que não aceitasse sofrer seu processo de manipulação.

Nervos acirrados, no ano de 1961 houve uma tentativa de invasão ao sul de Cuba, a investida era composta por exilados anticastristas e foi apoiada pelas forças armadas americanas e dirigida pela CIA, tratava-se de uma tentativa de derrubar o governo socialista. O governo estadunidense treinou os cubanos que não concordavam com o regime de Castro e que estavam exilados naquele país, a ideia era fazer parecer aos olhos do mundo que os próprios cubados eram contra o regime e também camuflar a participação dos Estados Unidos na invasão, tornando o ataque legítimo e enfraquecendo o regime. Porém a investida falhou, o governo cubano convocou a população civil para defender a nação da invasão, e o evento ficou marcado como um dos maiores fracassos da história dos Estados Unidos em combate, além de desmoralizar o governo norte-americano e colocá-lo em situação vexatória perante a comunidade internacional. O que era para ter derrubado e enfraquecido Castro, demonstrando que sua população não concordava com o regime colocado, acabou por fortalecer ainda mais o líder cubano e o regime vigente.

Depois disso, receoso por novas invasões, Castro resolve aproximar-se ainda mais da União Soviética – também de regime socialista, como Cuba – que instala mísseis nucleares naquele país. A cooperação entre os dois países é recebida pelo governo norte-americano como uma afronta e eminente ameaça, tendo em vista a localização estratégica da ilha. Com o desencadeamento da Guerra Fria, que tinha como mote principal a disputa ideológica entre os regimes capitalista e socialista, a relação entre Cuba e Estados Unidos torna-se ainda mais complicada e as duas nações passam a ser inimigas declaradas.

Recentemente o governo norte-americano iniciou uma reaproximação com o governo de Cuba, o que causou uma enorme polêmica e certo desconforto, principalmente àqueles que ainda acreditam que os países, com regimes ideológicos diferentes, não devam manter relações entre si a fim de não prejudicar a hegemonia capitalista. Todavia, trata-se de uma medida que acaba com o ciclo da Guerra Fria – com a liberdade de presos políticos e a retirada de Cuba da lista de países considerados terroristas pelos Estados Unidos -, e este é um passo importante no processo de evolução e amadurecimento das relações internacionais, eliminando anacronismos históricos que prejudicam o mundo como um todo.

Os recentes acontecimentos e crises econômicas sistemáticas têm demonstrado que o mundo já não comporta um sistema que resolve seus impasses através do terrorismo de mercado, guerras sangrentas e imposição de seus ideais por vias escusas. Se as intenções e vontade política do governo norte-americano forem de fato honestas e comprometidas com questões mais amplas – que não somente seu interesse econômico -, estamos prestes a experimentar um novo marco na história do mundo.

Vanessa Dourado é poeta e feminista latino-americana.

 

 


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