“Prince World ou sociedade a preço de banana” – Quando a arte cumpre seu papel pós-moderno: alienar para o consumo



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Jardélia Damasceno

O sujeito que reconhece a função da experiência como atividade mantenedora de sua práxis aproxima seu posicionamento frente à realidade. Dias atrás protagonizei uma experiência com a arte pós-moderna, onde a alienação e o consumo são elementos para a manutenção da banalidade, da “desfaçatez do cotidiano” embevecido por um sentimento intelectual individualista e sectário.

A montagem teatral itinerante “Prince World”, do EmFoco Grupo de Teatro, parte da V Mostra de Teatro Despudorado do Centro Cultural do BNB, em Fortaleza (CE), não representa, para além da estética, o verdadeiro vilão que nos oprime: o capital; mas escolhe com uma mentalidade preguiçosa o caminho das aparências, de como tanto repetidamente gritavam os atores: “TUDO É DESIGN!”

A arte quando advém do discurso dos grupos hegemonicamente favorecidos cumpre seu papel de defesa de classe, onde justificar suas práticas de falsa liberdade moderna é concluir a peça exercendo uma “boa ação” do dia, fazendo o público distribuir cup noodles aos moradores em situação de rua na Praça do Ferreira. Não, a gente não quer só comida e diversão, a gente quer arte com engajamento político.

A realidade pensada dentro de um modelo que não gera o conflito , incômodo e formigamentos das práticas reproducionistas do cotidiano em névoas não abre possibilidades para a consciência coletiva emancipatória da transformação social. A crítica a essa forma de arte não apadrinha-se com o conservadorismo, mas tem a pretensão, antes de tudo, de defender a necessidade do conteúdo e não apenas da forma.

Colocar um funil no ânus do outro e despejar vinho e sair beijando todo o público não os fazem libertários sexualmente; derramar coca-cola, desperdiçar comida no vômito em um quadro em branco “contemporâneo” não os tornam críticos acerca do veneno industrial que sua condição classe média põe a mesa; tampouco esculachar o cristianismo através da caricatura da concepção homogênea do fanatismo religioso não os tornam tolerantes.

Reproduzir uma miscelânea de fragmentos pós-modernos não unifica a luta social, mas sectariza, consome e aliena o público que se acomoda à sua situação de caridoso artístico, como um mártir da salvação do mundo, limitado ao perímetro dos seus conceitos de legitimação da forma, mas não aprofunda os verdadeiros anseios daqueles que sentem a realidade nua e crua da barbárie.

Prezad(a)os artistas, não subestimem seu público, não se espetacularizem em frases feitas, a gente quer conteúdo e conflito como possibilidade e não como entretenimento comercial e alegórico.

Despudorado é ousar, ser contraventor das estruturas, e não reproduzir ” pão e circo” que nos custa muito caro, que expropria de nós a coragem da luta pela transformação em benefício do autoengano político e social.

A observação participante que tive hoje só fortalece os formigamentos que venho tendo cotidianamente e me responsabiliza ainda mais a buscar caminhos de desvelamento individual e coletivo.

Se esse desabafo é não entender arte, então eu sou louca, e sendo louca, assumo os riscos em enxergar que o Rei está nu.

Jardélia Damasceno é maranguapense e paraibana de raiz, professora de Geografia e mestranda em Educação Brasileira em processo de formigamentos


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