Pablo Escobar e a globalização: A reinvenção do capitalismo no tráfico de drogas



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(Ilustração: Lara Albuquerque/Revista Berro)

Pablo Escobar foi o maior traficante de drogas já existente neste mundo. Sua fortuna era incalculável, assim também como a sua fama. Mas o que é mais incalculável ainda é a sua importância para o capitalismo moderno. Escobar revolucionou o mercado global, como jamais qualquer outro empresário fez ou fará. Isto porque a atividade da qual ele dedicava-se faz fluir grandes fluxos monetários para outros segmentos que dependem diretamente e indiretamente do comércio ilegal de drogas. Não só isso, ele industrializou um processo de produção que até antes era inconcebível industrializá-lo, colocando o comércio ilegal de drogas como a atividade comercial mais lucrativa do mundo. Se hoje a indústria das drogas movimenta 400 bilhões de dólares por ano ( 3% do PIB mundial), algo que a torna a atividade comercial mais rentável do mundo, toda essa estratosfera de dinheiro deve ser atribuída graças a esse grande personagem dos anos 80.

Antes de Pablo Escobar adentrar para esse negócio, a produção se dava através de manufaturas. Um processo de produção limitado e artesanal, sem possuir nenhum tipo de logística avançada. Pablo vivenciava, assim como as demais pessoas da época, um tempo de transição, onde o capitalismo como sistema econômico tornava-se, de fato, o modelo hegemônico em vigor, suprimindo todos os demais sistemas econômicos. O mundo caminhava a passos largos para a globalização. É neste exato momento que Pablo, juntamente com o Cartel de Cali, realizava o que eu chamaria de segunda revolução industrial da história do capitalismo. Eles entenderam a dinâmica do acúmulo de capital e que as drogas tornariam-se o epicentro cultural das novas gerações. É onde, então, realiza-se a industrialização do processo de produção de drogas, sofisticando e padronizando a produção, e dividindo-a em setores e ramais dos quais cada funcionário tem sua obrigação.

De menino pobre, Pablo Escobar torna-se um industrial. Em pouco tempo, 80% da cocaína que circulava no mundo era proveniente das fábricas de Escobar. Em 20 anos, essa indústria atingiria a marca de 400 milhões de clientes regulares em todo o globo terrestre.

O fato de ser uma atividade ilegal, contribui para o acúmulo de capital, pois não há leis trabalhistas ou organizações trabalhistas para os que trabalham para o tráfico de drogas. Os camponeses que plantam a matéria-prima não ganham mais que um dólar por dia. Se traçarmos os perfis, são pessoas de baixa escolaridade e que vivem em zonas rurais periféricas, isoladas das grandes cidades, sem acesso às estruturas que condicionam uma vida digna. Pessoas que já não possuem suas terras para agricultura familiar, pois perderam para os latifundiários do tráfico de drogas. Não há jornada de trabalho definida, não há férias, não há direitos. Aqueles que estão na base da pirâmide da produção possuem trabalho análogo ao escravismo. 

Outro fator importante, que contribuiu em números para o capitalismo, foi a grande leva de dinheiro a ser lavado. Algo que particularmente os bancos adoram, principalmente o HSBC (pesquisem: HSBC – LAVAGEM DE DINHEIRO PARA CARTÉIS MEXICANOS). Peço licença, neste instante, para citar trecho do livro de Peter Lilley Negócios ilícitos transformados em atividades legais: “A ascensão do crime organizado é hoje um fato aceito, ainda que lamentável, nos negócios realizados em todo o mundo. As enormes massas de dinheiro geradas por essas atividades precisam ser legitimadas pela lavagem e incorporação nos sistemas bancários e empresariais internacionais (…) Duzentos bilhões de dólares são lavados com sucesso a cada ano, no mundo todo”. Mais uma vez, é perceptível ver como a ilegalidade é algo que contribui para o fomento da riqueza daqueles que vivem dos negócios secundários e indiretos do tráfico. 

Pablo Escobar contribuiu não só para o grande capital, mas também para a geração posterior de industriais da droga de todo o mundo, com o manual do que se deve e o que não se deve fazer. Quem conhece sua história sabe que declarar guerra ao Estado não é uma boa opção. A verdade é que ele mostrou que o grande industrial deve ter a mão invisível para ter longevidade neste negócio, que apesar de muito lucrativo é também muito violento. Mas a violência aqui também é tida como um negócio secundário do tráfico de drogas.

Quando o ordenamento jurídico burguês declara que o cultivo e o comércio de drogas é algo ilegal, ele dá todo o aparato jurídico para o combate militarizado. Foi o que a maior potência do planeta fez, precisamente com Ronald Reagan nos anos 80, declarando abertamente o combate armado ao tráfico de drogas. O EUA é expert quando trata-se de mercantilizar conflitos.

O proibicionismo, como caráter de guerra, fez todos os Estados-nação terem pânico e construído no imaginário dos cidadãos que a “Guerra às Drogas” é algo que acabará com esse comércio. Com o tempo, mostrou-se uma grande mentira.

Toda essa dinâmica de violência movimenta mercados até então inexplorados. Feiras de segurança pública e aparatos militares são constantemente realizados. Isto fomenta a indústria armamentista. O combate que era para ter envolvimento social e médico, acaba tendo a natureza de confronto militarizado.

O capitalismo tem uma grande faceta, que é reinventar-se. Pablo Escobar é a personificação desta reinvenção dos tempos modernos. Obviamente Pablo não fez tudo isto sozinho, mas pelo seus movimentos comerciais e de atentados que protagonizou, ele é o que podemos chamar de chave mestra para abertura e consolidação de um novo mercado no sistema econômico.

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2 Replies to “Pablo Escobar e a globalização: A reinvenção do capitalismo no tráfico de drogas”

  1. Muito bom o texto…Na parte política a ênfase foi na militarização…Creio que poderia ser abordado também o impacto dos cartéis e facções no ambiente político (legislativo, executivo, judiciário) estadual e federal.
    Silverio

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